De vuelta, a paseo

Algumas observações de uma volta à cidade natal

Voltei a Buenos Aires para uns trâmites e para visitar a cidade depois de 18 anos sem voltar.

Nasci em Buenos Aires, a minha família saiu da cidade em ’82 para morar no interior, e não voltei a morar na cidade. A última vez que a visitei foi em 2000, antes da última grande crise. O que mudou ? O que está igual ?

Bajoneados

Em geral o argentino está cabisbaixo. Às vésperas de uma nova eleição presidencial , depois de um governo do Mauricio Macri com muita euforia e nenhum resultado prático, os argentinos não estão contentes com Macri e não acham que vá melhorar com Alberto Fernández / Cristina Kirchner, mas não estão dispostos a dar outro voto de confiança para o Cambiemos de Macri. Conversei na rua e principalmente com taxistas: mesmo os que não são favoráveis ao peronismo, não estão contentes com o atual governo, prevejo que Macri terá ainda menos votos do que nas primarias (PASO).

Os preços estão inflacionados e mesmo com reais a 7 centavos o peso (100 pesos = R$ 1) a comida está num preço excelente mas roupa está cara. Acho que nunca vi uma diferença de preço de peso / dólar e por consequência de peso / real. Isso porque o Brasil ainda vive uma recessão há mais de 4 anos, porém os argentinos não vêem uma luz no fim de túnel porque a aparente renovação política não aconteceu, e a volta do peronismo simula uma mudança social que nunca acontece.

Houve chuvas fortes na região marginal da cidade, e há ainda regiões alagadas como Quilmes, um município perto de Buenos Aires, que empresta o seu nome à famosa cerveja cuja indústria inicial estava nesse município.

Mesmo Macri dizendo que não inunda mais, Quilmes, La matanza e outros municípios periféricos da cidade continuam abandonados. O município de Quilmes começou a partir de uma população indígena calchaquí de aborigens do noroeste argentino (onde hoje é Tucumán), quando em 1666 perderam a guerra contra os espanhóis, e foram expatriados à força até o sudeste de Buenos Aires, confinados e depois extintos, e essas terras revendidas para formar o município atual. As terras as mesmas, o descaso também.

Macri foi uma decepção por não ter conseguido concluir nenhuma das reformas prometidas, não ter conseguido nenhum avanço na economia mesmo fazendo severos cortes orçamentários e ainda no final do mandato apelou ao populismo tão criticado para tentar recuperar os votos perdidos, o que foi contraproducente.

El dinero que se va

A última desvalorização do peso piorou ainda mais a situação que já era ruim e as carteiras estão recheadas de notas que não valem nada. Como os comerciantes estimulam os pagamentos ‘en efectivo‘ (em dinheiro) a carteira começa graúda de notas e termina magrela. Um café da manhã com um generoso copo de café com leite, suco, bolachinhas ou medialunas sai entre 120 e 180 pesos, uns R$ 10 a 15 reais. Um tênis pode sair por 1700 pesos, uns R$ 100. Tudo isso em notas de 5, 10, 20, 100, 500 e 1000 pesos. A carteira recheada de manhã sofre uma diarréia diária.

Há uma raiva das coisas terem dado errado. Também a desconfiança de um governo que pode ganhar nas urnas mas que terá poucas armas para ganhar na economia. Um comentarista do último debate disse estarem ‘disputando o timão do Titanic’.

Para entender o que o pessoal opina, puxo assunto com os motoristas de taxi (embora haja Uber, o taxi está barato e vale a pena). Eles foram unânimes em que nenhuma das opções é boa. Os favoráveis ao Macri admitiram que ‘se esqueceu das pessoas‘ e os mais partidários do peronismo que ‘isso não é peronismo, mas é o que temos‘. Os argentinos conseguem estar decepcionados mesmo com os políticos aos quais são favoráveis. Por que sindicatos se converteram em interesses. Associações de empresários do agronegócio são interesses, cada um puxando a sardinha para o seu lado, se afastando de acordos, onde o ganha-ganha virou perde-perde.

O centro da cidade está cheia de estrangeiros. O que estão passeando são principalmente brasileiros mas europeus também. Os que estão trabalhando são principalmente venezolanos. Argentina está barata para turistear e o centro é acolhedor.

Algumas dicas básicas de quem conhece Buenos Aires e vive no exterior faz tempo :

  • Procure pizza e massas
    • Argentina é famosa por carnes, mas também tem uma cultura italiana forte e as pizzas e massas são um espetáculo à parte. Se percorrer a Avenida Corrientes ou Avenida Santa Fe vai encontrar muitas casas com pizzas ou massas com porções generosas da grande massa da América Latina. Aproveite porque o preço é bom, a quantidade é gigante e a qualidade é demais !
  • Pode passear e comer tarde
    • Vários lugares de cidade fecham depois da meia-noite, principalmente nas avenidas famosas da cidade como Pueyrredón, Santa Fe, Avenida de Mayo , Rivadavia, onde há desde cafés até pizzarias até as 2 da manhã.Se for em algum dos espetáculos em Plaza de Mayo ou Corrientes, a avenida dos espetáculos teatrais, pode ficar na avenida e curtir as massas e carnes na mesma avenida.
  • Manifestações são importantes e são ordeiras
    • Vecinos” como são denominados usualmente os contribuintes, protestam pelos mais diversos motivos. Isso pode acontecer em Barcelona, em Caracas, em Santiago, em Cidade do México ou Chicago. Respeite as manifestações populares e lembre que são pessoas normais como você e eu, e se se identificar como estrangeiro, será respeitado deixado de lado.
  • Aproveite para beber vinho
    • Um bom vinho sai em torno de 40 a 50 reais no restaurante, que claro que tem sobrepreço. Qualquer tinto que escolher vai ser bom o suficiente para aromatizar sua noite. Desfrute desse privilégio da Argentina ser um dos maiores produtores de vinho do mundo, e com isso prestigie o produtor local. Ainda se quiser, escolha vinhos nos supermercados, onde poderá encontrar preços ainda melhores. Há excelentes vinhos por R$ 15 a R$ 20, um preço que será bem difícil de pagar no Brasil pela mesma qualidade.

Argentina vai conseguir se reerguer. Um dia. De um jeito ou de outro. Mas a ilusão de soluções fáceis já escorreu rio abaixo e os argentinos puxaram a descarga.

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Por Outro Lado

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