Transcrição do Episódio #17: Quando o PMRC enfiou o PAL

 

 

Um dos péssimos atores do western dos anos 40, Ronald Reagan saboreava o seu auge na política no final de 1984.

 

Presidente de 1947 até 1954 do maior sindicato de atores, governador da Califórnia nos anos sessenta pelo partido republicano. Ganha a primeira presidência em 1981 e é reeleito no final de 84.

 

Mas também nesse mesmo final de 84 está também no seu auge um redemoinho dançante de guitarras loucas chamado Prince. Prince sempre teve muita música ao redor. Seus pais eram do mundo do jazz, tinha primos cantores, e desde cedo tocava todos os instrumentos de suas composições. No começo dos oitenta consegue desenvolver um timbre único, e cria uma mistura de R&B, música eletrônica e rock que, na falta de outro rótulo, chamamos de ‘pop minneapolis’, uma das bases do pop dos anos oitenta.

 

Na música ‘Computer Blue’, Wendy ‘fala’ como o computador azul com Lisa.

 

Assim cria a aura de um computador frio dentro de uma música dançante e tensa ao mesmo tempo.

Então em 1984 Prince renova o R&B deixando ele dançante e pop enquanto Reagan governa com apoio da bancada evangélica americana, pelos conservadores no congresso, navegando no sucesso econômico. Ele usa o anticomunismo para impulsionar um aumento do gasto militar baseado no patriotismo e nas ideias conservadoras em voga na época. Batiza a Rússia soviética de  ‘império do mal’ e afirma que deve ser combatido para manter o american way of life. O objetivo era vencer a guerra fria, combatendo por debaixo do pano qualquer força favorável ao bloco soviético que esteja nos domínios ocidentais.

 

No final de 1984 Prince & The Revolution tem seu álbum de estréia “Purple Rain”. Os assuntos das músicas são, entre outros, a busca da personalidade do protagonista (The Kid) numa sexualidade mais livre num mundo onde tudo pode-se comprar ou fabricar. Prince compôs quase todas as músicas e algumas na colaboração das parceiras Wendy Melvoin, Lisa Coleman e Apollonia Kotero.

 

Prince já era um exímio guitarrista, além de se converter num performer único. E tinha uma voz cativante com a que conseguia gritar, cantar e manter notas altíssimas com uma naturalidade ímpar. Ainda em cada música questiona de uma forma muito pessoal nossa relação com familiares, com o sexo, com a tecnologia.

 

Eram muitas novidades para uma música pop: guitarras editadas passadas por sintetizadores, baterias eletrônicas, as letras sensuais, tudo editado de uma forma coesa e num som único, moderno e cativante. Prince insere solos virtuosos de guitarra nos momentos mais inusitados, seus vídeos eram danças elaboradas e sensuais e Purple Rain rendeu ainda um filme. Foi um enorme sucesso entre os jovens e embora o filme nem tanto, o álbum foi um sucesso de crítica e influencia cantores até hoje.

 

Cada música tem uma estrutura onde Prince consegue encaixar um momento de um diálogo instrumental, muitas vezes com performances na guitarra, momentos supremos no sintetizadores ou riffs acompanhados de baterias eletrônicas.

 

Enquanto isso, um Reagan confiante continuava indo cada vez mais longe no seu anticomunismo: no anterior mandato já houveram acusações de apoiar uma guerrilha de direita que tentava derrubar o governo sandinista na Nicarágua, os Contras. Depois de reeleito conseguiu autorizar um valor de 30 milhões para entregar armas para o Irã libertar reféns americanos. A ideia era trocar armas pelos reféns.

 

Só que 18 dos 30 milhões foram utilizados na verdade para financiar os Contras, um comando guerrilheiro de direita que tentava derrubar o governo nicaragüense sandinista. As provas das investigações posteriores mostraram que a CIA os financiou mesmo sabendo que eles usavam também o tráfico de drogas para financiar sua campanha. Na época Reagan negava tudo isso, e estava tudo OK.

 

Na sua bolha de felicidade e progresso, Tipper Gore,  como muitas mães ianques ao redor do país,  comprou Purple Rain para Karenna, sua filha de 11 anos. Era um disco popular. Ouvir Prince era descolado.

Tipper Gore era esposa do Al Gore, nessa época um importante membro da casa legislativa americana pelo Tennessee, e que depois seria o vice do presidente Bill Clinton. Al Gore também era descolado, tivera uma banda de rock na juventude e gostava desse novo rock influenciado pelo pop.

Não sabemos o que aconteceu nos aposentos dos Gore. Eu imagino a Karenna ouvindo no seu quarto e cantando junto com Prince :

 

I knew a girl named Nikki

I guess you could say she was a sex fiend

I met her in a hotel lobby

Masturbating with a magazine

She said how’d you like to waste some time?

And I could not resist when I saw little Nikki grind

 

Talvez sua mãe viu sua filha dançando e começou a prestar atenção na letra. Ou talvez a própria Karenna estivesse cantando com o Prince.

 

  • Que disco legal, mãe, obrigado! O que é se masturbar com uma revista ?
  • Eu quero também masturbar com a revista mãe! – diz a filha Krsitin de 5 anos

 

Tipper não deve ter acreditado nos seus ouvidos. A letra continuava deliciosa descrevendo uma Nikki super desinibida, indecente, provocadora, que abria portas que ela desesperadamente precisava…

 

A Tipper advogada deve ter procurado a noite toda por leis, convenções na mídia e descoberto que nenhuma legislação podia proibir mr Prince de escrever e publicar tal música. Prince ou outro músico podiam escrever letras com essas palavras, e nada podia ser feito. Gol para a primeira emenda que diz :

 

“O Congresso não legislará no sentido de estabelecer uma religião, ou proibindo o livre exercício dos cultos; ou cerceando a liberdade de palavra, ou de imprensa, ou o direito do povo de se reunir pacificamente, e de dirigir ao Governo petições para a reparação de seus agravos.”

 

Não importava que a música continha uma estrutura fabulosa de canção e de um redemoinho de baterias eletrônicas, guitarras que pareciam metralhadoras, que um Prince ensandecido cantava dançando entre oitavas com uma facilidade espantosa.

 

Mas existe outra possibilidade: as filhas de Tipper sequer terem se importado com a letra, e toda a sacanagem, balbúrdia e sexo proibido acontecerem somente na sua cabeça conservadora e amedrontada.

 

Ela tinha comprado o álbum para a filha e 

ficou horrorizada 

com uma porcaria de rima

com ‘se masturbar com uma revista’

 

Não ouvi o riff com guitarras dialogando com um sintetizadores, nem seu crescendo com a bateria eletrônica vibrando ?

 

Prince, para concluir o tripé do inferno, acaba a música com uma saudação, porém numa fala ao contrário, provavelmente para que Tipper Gore e outras mães imaginem uma invocação do mal. A saudação ainda é super positiva e diz que “o Senhor está vindo”. Mas porque Prince gravou a mensagem ao contrário? Não seria então o contrário, que o Senhor dele é o Senhor das trevas ?

 

Prince sempre foi evasivo ao explicar as suas letras e se servia de provocações para se promover, então deixou como sempre tudo no ar.

Mas Tipper Gore não podia deixar barato. Os anos 80 precisavam parar essa onda ‘libertina’. Como assim letras de ‘colocar o meu amor em você’ como do AC/DC ? Como assim ‘Me coma vivo’ do Judas Priest ?

 

Então ela e sua legião de mães conservadoras contra a libertinagem do rock fundaram o que seria o PMRC, Parents Music Resource Center ou Centro de Recursos Musicais para Pais. A proposta pública era discutir sobre a qualidade das músicas e teor das letras ouvidas por menores. Por trás disso, o interesse era a de dar ferramentas para proibir, banir ou impedir que essas músicas proliferem.

 

O núcleo duro era composto por quatro mães -e principalmente esposas de homens da política:

 

Além de Tipper Gore formavam parte: Susan Baker, esposa do James Baker, secretário do tesouro; Pam Howar, esposa de um famoso corretor de imóveis de Washington, Raymond Howar; e Sally Nevius, esposa do presidente do Conselho da cidade de Washington John Nevius.

 

Elas eram esposas de parlamentares e ‘gente de bem’ de Washington e ficaram conhecidas como as ‘Washington Wives’. Não era difícil para elas utilizar a influência na sua causa.

 

A primeira ação do ‘movimento’ foi listar 15 músicas ‘sujas’. Várias músicas que ficaram conhecidas como ‘As 15 nojentas’ foram marcadas pelo rótulo de conter ‘sexo’, outras continham ‘violência’ ou ‘mensagens demoníacas’ e outros rótulos como ‘apologia às drogas’.

 

1 Prince – “Darling Nikki” – Sex/masturbation

2 Sheena Easton – “Sugar Walls” – Sex

3 Judas Priest – “Eat Me Alive” – Sex/violence

4 Vanity – “Strap On ‘Robbie Baby'” – Sex

5 Mötley Crüe – “Bastard” – Violence/language

6 AC/DC – “Let Me Put My Love Into You” – Sex

7 Twisted Sister – “We’re Not Gonna Take It” – Violence

8 Madonna “Dress You Up” – Sex

9 W.A.S.P. “Animal (Fuck Like a Beast)” – Sex/language/violence

10 Def Leppard “High ‘n’ Dry (Saturday Night)” – Drug and alcohol use

11 Mercyful Fate “Into the Coven” – Occult

12 Black Sabbath “Trashed” – Drug and alcohol use

13 Mary Jane Girls “In My House” – Sex

14 Venom “Possessed” – Occult

15 Cyndi Lauper “She Bop” – Sex/masturbation

 

Mesmo que não houvesse uma menção clara, é óbvio vendo a lista que o heavy metal e o pop são os únicos alvos.

 

É curioso também que depois do heavy metal o outro alvo das Washington Wives sejam figuras femininas do pop como Madonna, Sheena Easton e Cyndi Lauper. Há um quê de repressão sexual aí. ‘Sugar Walls’ que Easton cantava era abusivo por ser uma referência à vagina, como se não houvesse centenas de músicas que faziam referência ao pênis de todas as formas.

 

O rock sempre foi rebeldia, mesmo quando as Washington Wives eram jovens. O heavy metal dos anos oitenta atraía os jovens com uma mistura de referências satanistas, roupa escura, uma antítese do ideal conservador cristão. A briga estava instalada.

 

Depois de colocar a discussão em pauta, o PMRC passou a pressionar as gravadoras. Assim como o cinema tem faixas de idade recomendando que seja visto por maiores de idade da faixa para o filme, deveria haver algum ‘aviso’ sobre o que ia ser consumido. Como diria mais tarde Frank Zappa “se parece censura, tem cheiro de censura, é censura, não importa a esposa de quem o diga.”

 

Um dos apoiadores que inclusive financiou o grupo foi Mike Love, um dos fundadores do Beach Boys. Embora ele diga ser progressista, as suas ideias o levaram a apoiar republicanos conservadores como Ronald Reagan e Donald Trump.

Prince além de encabeçar a lista conseguia estar em dois títulos, pois além de Darling Nikki Prince é autor da letra de ‘Sugar Walls’. Quem conseguiu a proeza foi o seu produtor David Leonard que também estava na produção de Purple Rain. Ele conseguiu um encontro da Sheena Easton com Prince onde conversaram de tudo. Depois disso ela não foi contratada como achava, mas Prince escreveu a letra de ‘Sugar Walls’ especialmente para o álbum solo dela sob o pseudônimo de Alexander Nevermind.

 

Podia haver centenas de músicas abusivas no folk, mas a preocupação do PMRC era que Easton convidava ao prazer do sexo oral feminino, e isso era um terrível tabu para quem criava meninas pré-adolescentes.

 

Ao contrário do que muita gente pensa, Frank Zappa não tinha nenhuma música  diretamente censurada. E ele tinha muitas músicas antigas com letras que com certeza sofreriam essa nova censura, mas na época tinha liberado a banda e estava compondo e tocando com o Synclavier e outros sintetizadores de forma a poder tocar suas composições humanamente impossíveis de serem tocadas, deixando com os robôs o trabalho pesado. 

 

Seu disco ‘Jazz from Hell’ é instrumental. Só há uma música com mais de um músico nela. Ele teve o selo ‘Parental Advisory’ por somente um par de meses e algumas lojas na California, supostamente pelo ‘Hell’ no título do álbum, mas foi mais uma jogada de marketing do que uma censura.

 

O PMRC avançava desenhando um selo contendo uma categorização de músicas com letras numa classificação especial marcando com o ‘X’ letras que continham sexo, ‘V’ para violência, letras ‘demoníacas’ com ‘O’ de oculto, e ‘D/A’ para menções sobre drogas ou álcool.

 

Houve muito debate sobre o assunto e algumas figuras da música passaram a aparecer nos talk shows para denunciar a censura dessas propostas.

 

Tipper Gore foi a alguns dos debates perdendo educadamente todos eles, mas o que importava era marcar presença.

 

Alguns comentaristas mais moralistas começaram a colocar uma lupa nos autores aumentando a exposição como imorais ou vulgares. Prince já tinha outra letra controversa na música ‘Sister’ onde descreve o incesto de um jovem com a sua irmã, deixando no ar se foi ou não auto biográfico -poderia ser até possível já que Prince conviveu na sua adolescência com as suas tres irmãs depois do divórcio dos pais, mas não há nenhuma certeza sobre isso. Mas o ponto é que passou a se rotular Prince de ‘defensor do incesto’, o que é um salto lógico, um declive escorregadio no argumento, manchando a imagem pública de um performer que menciona incesto em suas letras, em último caso um abuso que teria sofrido.

 

Um dos pontos fortes dos debates foi a entrevista no Crossfire com Frank Zappa. Tom Braden é o apresentador junto com comentaristas como Robert Novak, da casa, e John Lofton, um famoso conservador do Washington Times. Esse era o formato do programa, o apresentador e outro comentarista do canal entrevistando duas pessoas de opiniões contrárias num `fogo cruzado`.

 

O apresentador coloca os dois lados do problema dizendo que há letras de músicas que acha inapropriadas e que não acha que deveriam entrar na sua casa. Por outro lado, achariam correto que o governo proíba essas músicas ? E quem seria o censor ? Quem diria o que deveria ser rotulado ou o que não deveria ?

 

A defesa de Zappa é que não há nenhuma evidência científica de que certas palavras levem a pessoa a cometer tal ato seja de sexo, violência ou uso de drogas.

 

John Lofton tenta encurralar Zappa apelando para a qualidade das mensagens das letras.

 

JL – Você apoia álbuns que promovem o incesto como forma de sexo ou que em certas circunstâncias sería aceitável ? Você apoia isso ?

FZ – Não, eu não tenho interesse no incesto, mas não acho que alguém em sua sã consciência desejaria que o governo se entrometa instaurando um colégio censurador que impeça que se digam certas coisas 

FZ – Posso fazer uma declaração sobre o departamento de defesa nacional ?

JL – Sim

FZ – A maior ameaça hoje para os EUA não é o comunismo, é levar o país para uma teocracia fascista, e tudo o que aconteceu ao longo do governo Reagan nos leva exatamente para essa direção

(…)

TB – De que forma ? Me dê um exemplo de teocracia fascista

FZ – Quando existe um governo que prefere certo código moral derivado de certa religião, e esse código moral torna-se uma legislação que se encaixa ao ponto de vista dessa religião, e esse código resulta ser de muito muito de direita, quase no nível de Átila o Huno…

JL – Então vc é um anarquista, cada forma de governo é baseada em algum tipo de código moral, Frank

FZ – Moralidade em termos de comportamento, não em termos de teologia

 

Em meados de ‘85 a indústria fonográfica americana já tinha aceitado colocar uma etiqueta de ‘aviso parental’ denominado PAL (Parental Advisory Label) para álbuns que contivessem letras ‘potencialmente ofensivas’ e as lojas Wal Mart decidiram que não venderiam álbuns com esse selo.

 

Foi feita uma audição pública no senado norteamericano onde alguns autores queriam se pronunciar publicamente. 

 

Apareceram nas audições John Denver, autor de folk, Frank Zappa e Dee Snider, líder dos Twisted Sister. Dos tres somente o Twisted Sister estava nas ‘15th filthy list’.

 

John Denver explicou nas audições o porquê de estar lá: uma música sua tinha sido auto censurada por várias rádios do interior por terem considerado que a música era uma apologia às drogas, o que deixou ele revoltado. A música era Rocky Mountain High e é uma homenagem às Montanhas Rochosas no Colorado e à beleza bucólica de um jovem que as conhece e tem uma epifania sobre a beleza natural e imponente.

 

Isso leva ao primeiro ponto grave da censura sugerida pelo PMRC: censores assim como pessoas, interpretam, e mal interpretam letras. Tudo leva a privilegiar uma interpretação que geralmente fala mais dos preconceitos de quem ouve do que da música em si.

 

Dee Snider deixou claro que a sua letra ‘Under the Blade’ também foi mal interpretada. E sentenciou uma das frases mais contundentes das audições:

DS: “Há uma frase com a que concordo com o PMRC e é que é o meu trabalho monitorar o que os meus filhos veem, ouvem e leem durante sua pré-adolescência. A responsabilidade recai na minha esposa e em mim porque MAIS NINGUÈM é capaz de fazer esses julgamentos por nós.

 

Depois veio a audição do Frank Zappa. Usou e abusou de cutucadas irônicas além de deixar claro os principais argumentos sobre a implementação do selo.

 

Primeiro marcou um argumento contra a desonesta comparação com o rating de filmes: 

 

FZ: “Uma vez que muitos músicos escrevem e executam seu próprio material e o consideram sua arte (você goste ou não), uma classificação imposta irá estigmatizá-los como indivíduos. Quanto tempo para que os compositores e intérpretes sejam instruídos a usar uma faixa do PMRC no braço com sua letra escarlate?

 

John Denver também utilizou uma comparação ao regime nazi :

 

JD: “Um sistema de classificação do ‘establishment’, voluntário ou não, abre as portas para um desfile interminável de Programas de Controle de Qualidade Moral baseados em “Coisas que Certos Cristãos Não Gostam”. E se o próximo grupo do Washington Wives exigir um grande “J” amarelo em todo o material escrito ou executado por judeus, a fim de salvar crianças indefesas da exposição à doutrina sionista oculta?

 

As audições criaram polêmica. Eram bons argumentos. Mas não mudaram o fato de uma parcela pequena mas ruidosa da população clamar por uma regulação, e a indústria se amedrontar e adotar as sugestões do PMRC.

 

Mesmo assim a etiqueta acabou acontecendo. E a indústria não detectou queda nas vendas. A pressão das gravadoras nos autores para não serem rotulados foi interpretado pela maioria dos autores como censura.

 

Reagan teve que enfrentar em 86 o escândalo dos Contras, onde após uma investigação pelo Congresso americano ficou evidente que havia milhões desviados para apoiar os terroristas contra o governo nicaraguense por baixo do pano, além de provar que o governo sim negociou com os iranianos armas em troca de reféns apesar de Reagan sempre dizer `nunca negociar com terroristas`. Reagan não foi diretamente acusado. Sua popularidade despencou, mas conseguiu eleger Bush pai, que continuou e diversificou as loucuras intervencionistas de Reagan, que Bush filho perpetuou e desencadearam outros monstros.

 

A partir dos 90 o alvo passou a ser o rap e suas letras cruas e contestadoras. Então nessas rodadas seguintes de debates quem brilhou foi Ice T. Mas a etiqueta do PAL se consolidou apesar dos protestos.

 

Era época de talk shows, Oprah Winfrey organizou um debate onde estavam Tipper Gore, o líder da banda Dead Kennedys Jello Biafra, Ice-T e outros. A contra-capa do álbum Frankenchrist incluía a pintura ‘penis landscape’ do H R Giger, na mira do PMRC. Além disso, tempo depois Biafra iria participar na música “Freedom of Speech” do Ice-T, um verdadeiro manifesto contra o PMRC.

 

Ice-T se defendeu das acusações de ‘incentivar o estupro’ explicando que a linguagem que usa é das ruas e não existe essa defesa, além de dizer de não usar drogas, ir à escola mas que o PMRC pegava com pinças referências tiradas do seu contexto cultural.

 

Ice-T: O negócio é o seguinte: você tem que engolir a pílula toda, você ouve o meu álbum, você tem que engolir a pílula inteira. O problema com o Ice-T é que eu digo para não usar drogas, ir à escola, não ir para a cadeia, amar seu irmão, mas acontece que eu gosto de Freddy Krueger, se você abrir uma revista da Playboy eu vou dar uma olhada nela, então em outras palavras o que eu faço é mostrar-lhe uma pessoa inteira, todo mundo tem um algum vício, mas eu mostro a pessoa toda. O problema é que quando você mostra o vídeo de grandes apostadores você mostra a parte que não tem nada a ver com o assassinato real, aquele vídeo era sobre não ser um apostador e no final do vídeo eu acabo morto, você sabe.

 

É bom lembrar que liberdade de expressão para Biafra ou Ice-T era trazer o debate das ruas nas suas composições. Ser a favor de criar um partido nazi em pleno século XXI ou boicotar a vacinação numa pandemia não é liberdade de expressão, é liberdade de opressão.

 

Foi um interessante debate, mas a PMRC continuou ganhando batalhas: o Parent Advise Label reformulou sua etiqueta e marcou vários álbuns.

 

Ganhando batalhas ? Se olhar os indicadores da indústria hoje, o selo não faz com que a música ou o autor sejam menos ouvidos, em alguns casos é quase uma promoção e na maioria passa despercebido. Podemos pensar que o PMRC ganhou porque sua `marca` existe até hoje. Mas também podemos dizer que perdeu porque essa `marca` foi tão banalizada que não significa mais nada.

 

A autocensura das gravadoras se reduziu a um apito em algumas palavras proibidas. 

 

Afinal, o selo hoje faz parte do mercado fonográfico e da cultura musical. Num mundo sem álbuns ou CDs, os selos marcando como ‘explicito’ estão no título da música nos aplicativos que tocam as músicas com letras que contenham certas palavras tabu, que ninguém lê. No máximo a censura será a auto-imposta que não deixará ouvir claramente as merdas de putas censuras.

 

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Por Outro Lado

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